Hoje aprendim uma coisa sobre o ánti-semitismo. Estava lendo uma notícia referente a um discípulo de Louis Farrakhan que pronunciou um discurso na Universidade de Howard e não deixou de cuspir ferozes e violentas invectivas contra os judeus e os brancos.
E eu pensei: “Mas, sem dúvida, se o público (e pode que inclusso o orador) se detivesse a pensar um momento, daria-se conta de que estas acusações são ridículas”. E pensei também: “Mas, sem dúvida, o público tem que saber que os judeus temos sido amigos dos afroamericanos, e que sempre temos sido os primeiros e mais activos defensores dos Direitos Civis. Não têm mais que consultar as crônicas e…”.
Duas típicas reacções de branco progre de classe meia (de “judeu”, se o prefirem).
Mas a mim deram-me resposta a uma pergunta.
É uma pergunta que nos plantejávamos os judeus da minha idade durante a adolescência e a juventude. Interpelávamos aos nossos pais e perguntávamos-lhes (referindo-nos ao Holocausto): “Mas como permitiram (ou permitíchedes) que seguisse adiante? É que não veíades o que se estava a passar?”.
E, como é natural, os nossos pais não tinham resposta para aquela pergunta retórica e acusatória.
Hoje, com a minha reacção ao artigo, tenho achado a resposta àquela pergunta.
A minha reacção de branco progre de classe meia à cizanha de Farrakhan foi a mesma que tiveram os meus irmãos e irmãs da Alemanha ao começo do nazismo. “Mas é que estades mal informados. Mira, escuita um momento…”.
Esse foi o nosso erro: o ódio aos judeus não o provocam os judeus. Não se deve a malentendido algum. Nem sequer o provoca a necessidade de odiar aos judeus. Causa-o a simples necessidade de odiar. Os judeus não somos a causa do ánti-semitismo, não o tem provocado nada que nós tenhamos feito, e nada há que poidamos fazer para remediá-lo. Somos apenas a vítima eligida.
Não podemos remediá-lo, e intentá-lo não seria apenas inútil senão autodestrutivo. O único que podemos fazer é defender-nos de ele. As explicações, os razoamentos e, sobretudo, a tolerância em resposta ao ánti-semitismo têm efectos desastrosos para nós.
Não é que essas reacções agravem o problema. Não o agravam, mas fazem-nos perder de vista o perigo da indefensão. A razão não serve de defesa contra o ánti-semitismo. O menor vestígio de ódio racial é uma cunha inquisitiva cujo resultado final é o crime.
O ánti-semitismo não é ignorância, é loucura: a fúria humana dirigida contra um objectivo que se considera à vez adequado e desprotegido. De nada lhe serve a uma mulher apelar a razoamentos feministas para defender-se de um iminente violador. A causa da violação não é nenhum malentendido. Também não a provoca a vítima. O mesmo se passa com o ánti-semitismo.
Pido desculpas aos meus pais pelas minhas ingênuas perguntas, e por ter interpretado o seu silêncio como ignorância ou complicidade.
A Torá diz que Amalec estará conosco em cada geração. A absurda pergunta dos jóvenes era, mais que outra coisa, uma expressão do desejo de que a sua geração se librasse. O silêncio dos meus pais era pura cortesia.
DAVID MAMET
(Publicado em The Forward)
09/12/09
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