08/04/10

O DIA EM QUE ISRAEL SE MANTEVE FIRME ANTE WASHINGTON


Mentres a tensão entre os EEUU e Israel alcançam limites desconhecidos, vem-se-nos à memória outro cúmulo de tensões que se produzira há perto de trinta anos, quando Menajem Begin e Ronald Reagan ocupavam a máxima magistratura. Em contraste com as reiteradas desculpas de Binyiamin Netanyahu, Begin adoptara uma posição bem distinta.

A seqüência dos factos começara com umas manifestações do ditador sírio Hafez al-Asad nas que afirmava que não asinaria a paz com Israel “nem sequer nos próximos cem anos”. Begin respostara incorporando os Altos do Golan ao território nacional de Israel, rematando assim com a administração militar existente naquele lugar desde a época em que as forças armadas israelis se figeram com o seu controlo em 1967. A legislação que ratificou este passo foi aprovada sem dificuldade alguma no Parlamento de Israel o 14 de Dezembro de 1981.

Este passo produziu-se, porém, apenas duas semanas depois de que os EEUU e Israel asinassem o Acordo de Cooperação Estratégica, o qual motivou uma grande irritação em Washington. A iniciativa do Secretário de Estado, Alexander Haig, o Governo dos EEUU suspendeu unilateralmente o acordo que vinha de ser implementado. Um dia mais tarde, o 20 de Dezembro, Begin fixo chamar a Samuel Lewis, Embaixador dos EEUU em Tel Aviv, para dar-lhe um “repasso”.

Yehuda Avner, antigo ajudante de Begin, proporciona-nos a atmosfera e uns quantos comentários relativos a este episódio em “Quando Washington embridou e Begin dixo basta”. Segundo ele lembra, “O Primeiro Ministro convidou a Lewis a tomar asento, endureceu o rosto, sentou-se, alcançou um feixe de papeis da mesa que tinha ao seu lado, puxo-os no seu regazo e esbozou um gesto de ferro e uma voz como aceiro”. Begin começou “um tormentoso recitado de todas as perfídias perpetradas por Síria ao longo de décadas”. Rematou com o que ele denominou “uma mensagem muito urgente e pessoal” para o Presidente Reagan.

“Em três ocasiões, durante os passados seis meses, o Governo dos EEUU tem tratado de ‘castigar’ a Israel”, começou dizendo Begin. E passou a enumerar aquelas três ocasiões: a destrucção do reactor nuclear iraqui, o bombardeo dos quarteis da OLP em Beirut, e agora a Lei sobre os Altos do Golan. No meio deste parlamento, segundo Avner, Lewis tratava de interromper sem éxito: “Não é um castigo, Sr. Primeiro Ministro, simplesmente uma suspens…”, “Desculpe, Sr. Primeiro Ministro, não se trata de…”, “Sr. Primeiro Ministro, devo corrigir-lhe…”, e “Não é um castigo, Sr. Primeiro Ministro, é apenas uma suspensão até…”.

Mas decidido a exprimir a sua fúria, Begin esboçou todo um século de Sionismo:

Que tipo de expressão é essa –“castigar a Israel”? Somos acaso um Estado vasalo dos EEUU? Somos uma república bananeira? Somos uns adolescentes aos que se não se comportam adequadamente se lhes dá um sopapo. Deixe-me dizer-lhe quem conforma este Governo. Este Governo está formado por pessoas que adicaram as suas vidas à resistência, a combater e a sofrer. Não nos ides amedrentar com os vossos “castigos”. Aquele que nos ameaze só receberá a nossa indiferência às suas ameaças. Só estamos dispostos a escuitar argumentos racionais. Vós não tendes direito algum a “castigar” a Israel –e alzarei a minha voz cada vez que utilizedes esse termo.

Na parte mais punzante da sua crítica aos EEUU, Begin desdenhou a moralina norteamericana sobre as baixas civis durante o ataque israeli contra Beirut:

Vós não tendes nenhum direito moral a discursear-nos sobre as baixas civis. Nós temos lido a história da 2ª Guerra Mundial e sabemos bem o que se passou com os civis quanto decidísteis agir contra o inimigo. Também temos lido a história da guerra do Viet-Nam e o vosso lema “cada corpo conta”.

Referindo-se à decisão dos EEUU de suspender o acordo recém asinado, Begin anunciou que “O povo de Israel tem vivido 3.700 anos sem nenhum memorándum ou acordo com os EEUU –e será capaz de sobreviver outros 3.700 sem ele”. A um nível mais mundano, lembrou que Haig se comprometera no nome de Reagan a que o Governo dos EEUU aportaria 200 milhões de dólares em armas e outros equipamentos a Israel. “Agora dizes que não vai ser possível. O que não é senão uma violação da palabra do Presidente. Este é o vosso costume? Parece-vos adequado?”.

Lembrando o então recente debate no Senado dos EEUU sobre a decisão de vender AWACS a Arábia Saudi, Begin sinalou que fora “acopanhado duma suja campanha de ánti-semitismo”. A modo ilustrativo, mencionou três exemplos: os eslogans ‘Begin ou Reagan?’, ‘Não deixaremos que os judeus marquem a política exterior dos EEUU’, e as insinuações de que senadores como Henry Jackson, Edward Kennedy, Robert Packwood, e Rudy Boschwitz “não são cidadãos leais”.

Em quanto à exigência de que renunciassem à Lei dos Altos do Golan, Begin remontou o próprio conceito de ‘renûncia’ aos tempos da Inquisição lembrando a Lewis que:

Os nossos antepassados preferiram ir parar à fogueira antes que ‘renunciar’ à sua fê. Nós não nos dirigimos à fogueira. Graças a D’us. Temos a suficiente fortaleza como para defender a nossa independência e os nossos direitos. Faga o favor de informar ao Secretário de Estado de que a Lei dos Altos do Golan seguirá tendo validez. Não existe força no mundo capaz de fazer-nos renunciar a ela.

A reunião rematou sem que Lewis fosse quem de responder. Segundo lembra Avner, “enfrontado com esta barreira infranqueável, que ao Embaixador lhe deveu semelhar em parte hiperbólica, e em parte paranoica, não foi quem de contraargumentar. Tras o qual, colheu e marchou”.

[O resto da história é conhecida].


DANIEL PIPES

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