18/04/10

JERUSALÉM ESTÁ POR RIBA DA POLÍTICA

O escritor e activista de fama mundial, Elie Wiesel, laureado com o Nobel e supervivente do Holocausto, publicou anteontem simultaneamente um artigo nos principais jornais estadounidenses exprimindo o seu ponto de vista sobre a cidade de Jerusalém. Velaqui as suas palavras no The International Herald Tribune, The Washington Post e The Wall Street Journal, e que aparecerão também na edição de hoje do The New York Times.


Era inevitável: uma vez mais, Jerusalém está no centro do debate político e da tempestade internacional. As velhas e as presentes tensões reaparecem novamente de modo inquedante. Dezesete vezes destruída e dezesete vezes reconstruída, segue estando no meio das confrontações diplomáticas que poderiam desembocar noutro conflito armado. Nem Roma nem Atenas têm avivado tão numerosas passiões.

Para mim, para o judeu que eu sou, Jerusalém está por riba da política. É mencionada mais de seiscentas vezes nas Escrituras –e nem uma só no Coran. A sua presença na história judia é abrumadora. Não existe pregária mais comovedora na história judia que aquela que exprime a nossa anhorança por regressar a Jerusalém. Para muitos teólogos, É a história judia, para muitos poetas, uma fonte de inspiração. Pertence ao Povo Judeu e é muito mais que uma cidade, é o que liga a um judeu com outro dum modo que resulta dificil de exprimir. Quando um judeu visita Jerusalém pela primeira vez, não é a primeira vez; é um regresso ao fogar. A primeira canção que lembro era uma nana da minha mãe sobre e para Jerusalém. A sua tristeza e alegria são parte da nossa memória colectiva.

Desde que o Rei David instaurasse em Jerusalém a sua capital, os judeus têm vivido entre os seus muros com apenas duas interrupções; quando os invasores romanos lhes proibiram o acceso à cidade e, novamente, quando sob a ocupação jordana, os judeus, a pesar da sua nacionalidade, foram proscritos de entrar no velho bairro judeu a meditar e rezar junto o Muro, último vestígio do Templo de Salomão. É importante lembrá-lo: de não se ter alinhado Jordânia com Síria e Egito na guerra contra Israel, a cidade velha de Jerusalém seguiria em mãos árabes. Sem nenhum género de dúvidas, igual que os judeus estavam dispostos a morrer por Jerusalém, não teriam matado por Jerusalém.

Hoje, por vez primeira na história, judeus, cristãos e muçulmães podem orar livremente nos seus santuários. E, contrariamente ao que afirmam alguns meios de comunicação, judeus, cristão e muçulmães PODEM construir os seus fogares em qualquer parte da cidade. A angústia que provoca Jerusalém não tem nada a ver com o estado real das coisas, senão com a memória.

Qual é a solução? As pressões não conduzirão a nenhuma solução. Existe uma solução? Deve havê-la, deveria havê-la. Por que acometer o problema mais complexo e sensível prematuramente? Por que não dar primeiro passos que propiciem que as comunidades judias e palestinianas achem formas de convivência numa atmósfera de seguridade? Por que não deixar o mais dificil, o tema mais sensível, para esse momento?

Jerusalém deve seguir sendo a capital espiritual mundial dos judeus, não um símbolo de angústia e amargura, mas um símbolo de confiança e esperança. Como dixo um mestre jasídico, o Rebbe Nahman de Bratslav, “Cada coisa neste mundo tem um coração, e o coração à sua vez tem o seu próprio coração”.

Jerusalém é o coração do nosso coração, a alma da nossa alma.



ELIE WIESEL

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