21/02/10

KOSOVO, O AVISPEIRO DAS CIVILIZAÇÕES

Muito mais do admitido em público preocupou aos governos da Europa Occidental a crise em torno aos gitanos procedentes dos Balcães produzida há dois ou três anos, e que se reavivou tras a eliminação das fronteiras com os novos sócios da União Europeia (UE) no leste do continente. Sí Itália semelhou adoptar medidas contundentes nte o que a opinião pública percebia –e sofria- como um incremento intolerável da delinqüência organizada a grande escala. Mas se o Governo Berlusconi levou a voz de escândalo entre os bempensantes, a maior parte dos países europeus ocidentais afrontaram caladas políticas de expulsões massivas, Espanha incluída, embora só com a ocasional filtração dalguma orde policial que vinha contradizer as almibaradas peroratas de irmandade universal do Presidente Rodríguez Zapatero. Mas as capitais europeias aínda não estám satisfeitas. Queremmais –ou menos, melhor dito. Querem que as expressões “gitano balcânico” e “banda albanokosovar” não continuem aterrorizando à imensa maioria da população europeia. E é aí onde os fontaneiros de Europa estám-se aplicando a prazer, jásem nenhum complexo.

A diferença dum Rodríguez Zapatero em total fóra de jogo na sua presidência de trno da UE –às vezes numa patética e humilhante marginação, como no último cúmio sobre a crise económica em Grécia-, o Executivo belga leva anos literalmente preparando-se para o relevo que tomará de Espanha em Julho deste ano. De facto, quando apenas vai transcorrido m mes e meio da presidência espanhola, nada menos que o Primeiro Ministro belga se achegava a praça tão complexa como a de Kosovo para pulsar a situação e reafirmar uma vez mais o seu apoio a uma futura incorporação do “país balcânico” à União.

Coincidindo com o segundo aniversário da declaração unilateral de independência, as felizitações e a falha de elas continuam marcando o difcil reconhecimento internacional de Pristina, quase geralizado em Europa –agás Espanha, o caso óbvio de Sérbia, e pouco mais significativo- mas também quase negado fóra do continente europeu, com especiais e persistentes resistências no âmbito árabe e muçulmão.

De facto, mentres Turquia enviava uma cálida mensagem de felicitação com motivo do segundo ano do Kosovo independente –o seu mimado e cada vez mais penetrado portaaviões religioso, político e financieiro em Europa-, em Belgrado o Presidente Tadic desfazia-se em agradecimentos com o Ministro egípcio de AAEE que lhe levava em bandeixa de prata a reforçada negativa do Cairo a reconhecer a “declaração unilateral de independência dos albaneses de Kosovo”, como se denomina em Sérbia a traumática e internacionalizada egregação duma parte do seu território.

Desde Bruxelas intenta-se compensar o apoio à amputação kosovar com um cálido tratamento às ânsias europeístas que, por escasa marge, trunfaram nas últimas eleições sérbias sobre a metade da população que segue olhando face a Mãe Rússia. Uma das medidas mais significativas, nesse sentido, foi o levantamento da exigência de visado na metade do ano passado para os cidadãode Sérbia, Macedônia e Montenegro. Naquela ocasião, Bruxelas negou-se a amplar uma medida desse calado aos últimos, e muito problemáticos, restos dos Balcães não europeizados ou em vias de sê-lo.

As acusações de “islamofóbia” e de fomento dum “ghetto muçulmão” escutaram-se quase a berros nas marginadas Bôsnia, Albânia e o próprio Kosovo. Mas segundo se está descobrindo agora com mair nitidez, é óbvio que a carta da eliminação do visado para ostrês países de maioria muçulmã pouco tem a ver com os fázeis e cansinos prantos da islamofóbia, e sim com o seu aproveitamento numa mão de póquer internacional de mais e imediatas conseqüências.

A imprensa de Prístina publicava esta mesma semana como os países mais potentes de Europa estám condicionando o seu apoio à aliminação do humilhante trâmite aduaneiro entre europeus a que Kosovo aceite uma repratriação massiva dos seus difíceis lugarenhos. O próprio Executivo kosovar já admite acordos nesse sentido com vários países europeus –França, Bélgica e a extracomunitária Suíça, entre eles. Os países escandinavos –aonde chegaram os nômadas gitanos criando um clima irrespirável de convívio, que uniu a políticos liberais e conservadores na exigência do seu combate- também se estám empregando a fundo na sua exigência de que “gitanos” e “albanokosovares” não gitanos, mas ultraviolentos não obstante, emprendam o caminho de regresso.

As presões não são apenas descritas por informações de imprensa em Prístina, senão por organizações como o Conselho de Europa – o mesmo Conselho de Europa que investiga o tráfico de órgaos organizado por bandas armadas kosovares desde a “Casa Amarela”-, cujo Comissário para Direitos Humanos visitava também esta semana o polêmico campo gitano de Kosovska Mitrovica, auspiciado pela ONU ao norde de Kosovo, onde exigia o fim dos regressos forçosos desde a Europa rica e aterrada.

“Fago um chamamento aos países europeus para que detenham os retornos forçosos até que Kosovo esteja preparado para assegurar as necessárias condições de vida, asistência médica, educação, serviços sociais e de emprego”, dizia Thomas Hammarberg ao seu regresso a Estrasburgo desde uns campos que se habilitaram há uma década, em plena guerra serbo/serbokosovar/albanokosovar tras o incêndio das casas dos gitanos por parte dos seus próprios vizinhos albaneses que os acusavam de colaboracionismo com os sérbios, segundo os informes das organizações de vigiância de direitos humanos.

Para o Comissário de Direitos Humanos do Conselho de Europa, o tratamento que se está dando aos gitanos em Kosovo é “escandaloso”. Hammarberg lembrava que, como conseqüência da dificil situação em Kosovo, onde o desemprego alcança o 50% da população e não existem infraestruturas para acolher aos milheiros de “despraçados” internos e externos, agora está-se produzindo um efecto boomerang, com cada vez mais “refugiados” pensando no regresso à Europa Occidental.

“Uma grande quantidade de refugiados têm vivido nos países de acolhida durante muitos anos, e os seus filhos nasceram ali, falam de modo fluído os idiomas desses países e não têm conexões com Kosovo”, afirmava o Comissário de Direitos Humanos. Como conseqüência de tudo isto, “muitos dos refugiados regressam aos países de acolhida tão ráido como lhes resulta possível”, advertia Hammarberg no que semelha uma bem calculada ameaça velada sobre os resultados das expulsões forçosas e o que em breve muitos países europeus podem volver a agardar.

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