06/01/10

OCCIDENTE ESTÁ PARALISADO PELO TERROR


Um somali irrompeu na casa de Kurt Westergaard o passado venres armado com um machado e um coitelo. Pesa sobre ele a acusação de intento de assassinato contra o debuxante danês.

O ataque contra Westergaard não tem sido o primeiro intento de perpetrar uma mortífera fatwa. Quando os muçulmãos trataram de assassinar a Salman Rushdie vinte anos atrás, as protestas entre os intelectuais foram ostensíveis. Hoje, sem embargo, os escritores e intelectuais occidentais prefirem pôr-se a coberto antes que defender os seus direitos básicos.

Em 1988, a novela de Salman Rushdie, “Os versos satânicos” fora publicada em edição original inglesa. A sua publicação levara ao Estado iraniano e o seu dirigente revolucionário, o Ayatolá Jomeini, a promulgar uma “fatwa” contra Rushdie oferecendo um suculento botim pela sua execução. Isto desencadeou simultâneos ataques contra ou tradutores e editores, incluíndo o assassinato do tradutor japonês Hitoshi Igarashi. Milhões de muçulmãos em todo o mundo, que jamais lêram uma só linha do livro, e que nem sequer ouviram nunca o nome de Salman Rushdie, queriam que a sentença de morte contra o escritor fosse levada a cabo –e quanto antes melhor, de modo que a honra mancilhada do Profeta ficasse limpa de novo com o sangue de Rushdie.

Naquela atmosfera, nenhum editor alemão teve a coragem de publicar o livro de Rushdie, Isto levou a um punhado de famosos autores alemães, encabezados por Günter Grass, a tomar a iniciativa de assegurar a publicação do trabalho de Rushdie na Alemanha fundando uma editorial exclussivamente a tal propósito. Chamou-se Artikel 19 –atendendo ao parágrafo da Declaração Universal dos Direitos do Homem que garante a liberdade de expressão. Dúzias de editoras, organizações, jornalistas, políticos e outros prominentes membros da sociedade alemã uniram-se à iniciativa, na coaligação mais ampla que se tenha formado jamais na história da postguerra alemã.


Simpatia pelos sentimentos feridos dos muçulmãos

Dezesete anos mais tarde, depois de que o diário danês Jyllands-Posten publicara uma dúzia de caricaturas de Mahoma numa mesma página, houvo reacções semelhantes no mundo islâmico às acontecidas tras a publicação de “Os versos satânicos”. Milhões de muçulmãos de Londres a Yakarta, que nunca viram as caricaturas nem sequer ouvido o nome do jornal, tomaram as ruas em protesta contra um insulto ao Profeta e exigindo o castigo adequado aos transgressores: a morte. O dirigente de Al Qaeda, Osama bin Laden, inclusso chegou a solicitar a extradição dos debuxantes, para que puidessem ser condeados por uma Corte islâmica.


Esta vez, sem embargo, em contraste com o caso Rushdie, apenas ninguém tem amosado a sua solidariedade com os caricaturistas daneses ameazados –mais bem o contrário. Grass, que promovera oa campanha do Artikel 19, exprimiu a sua comprensão pelos sentimentos feridos dos muçulmãos e as violentas reacções derivadas. Grass descreveu-nas como “a resposta fundamentalista a um acto fundamentalista”, estabelecendo uma equivalência moral entre os 12 debuxos e as ameazas de mrte contra os debuxantes. Grass acrescentou que “temos perdido o direito de solicitar protecção sob o gardachuvas da liberdade de expressão” (…) “Acredito que a publicação destas caricaturas tem sido inecessária, insensível, irrespetuosa e errônea”, comentou o daquela Secretário de Estado Britânico Jack Straw, referindo-se à decisão de várias organizações jornalísticas europeias de re-editar as caricaturas. Mentres, “Vorwärts”, órgao alemão do centro esquerdista SPD –um dos dois maiores partidos do país- fixo uma defesa da liberdade de expressão em geral, mas sublinhando que neste caso em concreto, os daneses “abusaram” da liberdade, “não num sentido legal, mas desde o ponto de vista político e moral”. Para Fritz Kuhn, o daquela dirigente parlamentário do Partido Verde, tratou-se duma experiência déjà vu: “As caricaturas lembram-me as vinhetas ánti-judias da época hitleriana anterior a 1939”. Com a sua afirmação, Kuhn, que nasceu em 1955, demonstrava ou que tinha uma memória pré-natal sensacional ou que nunca vira uma caricatura ántisemita no jornal de propaganda názi “Der Stürmer”.

Como eunucos falando de sexo

Foi como escuitar a uns cegos falar de arte, uns surdos de música ou uns eunucos discutindo de sexo. Porque, com a excepção do jornal de esquerda Die Tageszeitung, o conservador Die Welt e o centrista Die Zeit, todos os jornais e revistas alemães seguiram a consigna da dirigente do Partido Verde, Claudia Roth, que dixo que “o apaciguamento começa na própria casa”, optando pela postura de cautela de não publicar as caricaturas. O prominente psicoanalista alemão, Horst-Eberhard Richter manifestou: “Occidente deveria evitar qualquer provocação que produça sentimentos de subestima ou humilhação”. Por suposto, Richter deixou aberta a questão de se Occidente deveria também reprimir o uso de mini-saias, comer porco e a legalização da homosexualidade, para evitar causar sentimentos de subestima e humilhação no mundo islâmico.

Se as caricaturas de Mahoma tivessem sido ré-editadas pela totalidade da imprensa alemã, os leitores poderiam ter comprovado por sim próprios quam inofensivos eram os 12 debuxos e até que ponto o debate tinha tomado uma deriva absurda e disparatada. Em vez disso, deixou-se a iniciativa a “expertos” que anteriormente foram firmes defensores de qualquer crítica contra o Papa e a Igreja, assim como de qualquer obra de arte blasfema, em nome da liberdade de expressão, mas que, no caso das caricaturas de Mahoma, adoptavam repentinamente o ponto de vista de que se devem tomar os sentimentos da gente com uma religião distinta em consideração.

Mas esse argumento não era senão uma clara excusa, um modo de desculpar o facto de que gardavam silêncio por medo. A fim de contas, no lapso entre o assunto Rushdie e a debacle das caricaturas se passaram umas quantas coisas: o 11-S, as bombas de Londres, Madrid, Bali, Yakarta, Djerba –sucessos que alguns comentaristas interpretaram como uma reacção do mundo islâmico à sua degradação e humilhação por Occidente. Contra esta ameaça, semelhava mais razoável e, sobretudo, mais seguro, amosar “respeito” aos sentimentos religiosos antes que insistir no direito à liberdade de expressão.

O direito a ofender é mais importante que proteger ao ofendido


Muito pouca gente amosou a disposição de discrepar desta postura, Entre eles esteve o cómico Rowan Atkinson (Mr. Bean), quem no transcurso dum debate sobre a suposta legislação incitadora do ódio existente na Grande Bretanha, declarou que “o direito a ofender é muito mais importante que qualquer direito a não ser ofendido”. E a somali Ayaan Hirsi Ali, uma mulher muçulmã secular que daquela vivia na Holanda, e que respondeu com um manifesto que começava com as palavras “Estou aquí para defender o direito a ofender”.

Mas foram apenas parte das escasas excepções. Inclusso o daquela Presidente francês, Jacques Chirac, esqueceu temporalmente que representava ao país de Sartre, Voltaire e Victor Hugo, e proclamou que “qualquer coisa que seja ofensiva para a fê de outros, especialmente no que se refire às crenças religiosas, debe ser evitada”.

Começava o apaciguamento que fora solicitado. O único problema é que a outra parte não pensa em termos de “apaciguamento”. A fatwa contra Salman Rushdie segue vigente, e o intento de assassinar a Kurt Westergaard a semana passada não foi a primeira tentativa de culminar uma sentença de morte por um crime não cometido. Pode que o Islam seja a “religião da paz” na teoria, mas semelha muito diferente na prática.

Uma advogada turco-alemã residente em Berlin central teve que procurar refúgio e ocultar-se recentemente por receber ameazas de morte tras publicar um livro. O tomo não inclui caricaturas de Mahoma. Apenas é o título o que serve de provocação: “O Islam necessita uma revolução sexual”.


HENRYK M. BRODER

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